segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Elena


Elena é um documentário brasileiro de 2012 que fala sobre suicídio e luto, mas, diferente de filmes que tratam desses assuntos e, apesar se ser um documentário (amo documentários, quis dizer que falar de suicídio nessa categoria pode ser muito duro), é poético, mas sem ser romântico. Não é uma tentativa de "morte romântica".
A forma como o documentário é rodado é bem diferente, não sei o nome técnico, mas mostra imagens soltas, não é um contínuo. Esse clipe do Moska usa essa técnica:

Petra em NY
O documentário mostra a busca da irmã de Elena, Petra (que é a diretora e a atriz do documentário), em busca da irmã. Ela está em Nova York, cidade onde passou parte da sua infância e onde Elena se lançou para uma nova carreira de atriz na juventude.

As imagens as quais me referi acima são recortes de filmagens que Elena fez desde quando ganhou uma filmadora, na década de 80 eu acho, e imagens que Petra faz na NY atual. Tem as palavras da mãe das duas, o apartamento onde moraram, as ruas, as luzes, as gravações de áudios de Elena (que substituía as cartas por áudios). Petra parece trilhar os mesmos passos da irmã: se identifica com os diários dela, se identifica com a tristeza que a irmã sentia, quer ser atriz, vai estudar em NY.

fragmento do diário de Elena

Petra é o bebê e Elena


Ao final (sem ser um spoiler), Petra encontra a irmã, se reinventa e cria novos caminhos, à luz do que a irmã significou para ela.

atuação de Elena no teatro
mãe de Elena e Petra
É um documentário muito bonito. No início, pode parecer estranho, porque não se vale de contar uma história linear, com a câmera acompanhando os personagens; é outra coisa, são imagens, tais como se fossem o conteúdo de uma memória - sem ordem, acronológica, caótica muitas vezes - que fala de uma pessoa que morreu, o que foi a história com essa pessoa, as narrativas ouvidas, as imagens captadas (também as filmagens feitas por Elena), os recortes de jornais, enfim, uma trajetória, ainda que muito curta, criada por Elena, em que Petra, resgata, reconta e se reencontra.

Elena e Petra


Para mim, o luto, ou melhor, a falta de alguém que morreu, é algo que fica para sempre. É uma cicatriz simbólica, é uma marca que fica. E foi justamente essa falta e tudo que ela representa que foi referência para que Petra trilhasse seu caminho.

Nota: 9.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

A Parede (Die Wand / The Wall)


É um filme alemão de 2012 e um tanto inusitado. Tem paisagens deslumbrantes e a trilha é brilhante, salpicada ao longo do filme, não tem uma cena em que a música se estenda, é pontual. É um filme lento e silencioso.

Conta a história de uma mulher, que vai ficar na casa das montanhas com um casal, não sabemos quem eles são e qual a relação entre eles. Esse casal sai e no dia seguinte, quando a mulher acorda, não os encontra e descobre que ela está "presa" dentro de uma espécie de redoma que a impede de passar por além dos limites da parede transparente e parece que o que está "do outro lado" parou. 

aqui é uma parte da redoma. Detalhe para as paisagens!


Parece que ela vive num lugar isolado e esquecido do mundo.
Sobre a mulher não sabemos seu nome e ela praticamente não fala o filme inteiro, ouvimos a narração em "off" do diário que ela começa a escrever com papéis que encontra pela cabana.



O que me impressionou foi a personagem ser impassível e conformada à nova realidade: se adaptar para tornar suportável. Ela não se rebela, tenta se adaptar àquilo. Somente num sonho aparece ela gritando, só no sonho. Isso foi um incômodo pra mim. Numa situação-limite como essa, a loucura seria um escape privilegiado, mas a mulher simplesmente aceita aquela situação, ela tenta romper a barreira invisível algumas vezes (inclusive tenta avançar com o carro), mas nada que a fizesse desesperar. Será que o pensar constante, o amor (pelos animais) e a escrita a impediram de se entregar às fantasias e alucinações? Ou seria essa realidade uma forma de loucura?

Nessa trajetória, alguns animais a acompanham, principalmente Luchs, um cão que a acompanha em todos os lugares: nas caçadas, nas colheitas, nas caminhadas. Tem também a Bella, que é uma vaca, um bezerro, e dois gatos, além do corvo branco, mas esse com menos contato (inclusive ela faz uma reflexão muito interessante sobre o corvo).

Uma coisa interessante do filme é a relação dela com o cão. Ela mesmo fala que os dois não eram mais cão e mulher, eram uma coisa só, tamanha a relação entre eles.  Achei bonito essa noção de integração entre os seres vivos, sem distinção. A relação dela com os animais é íntima, ela trabalha duro na plantação e na caça, para se sustentar, mas também para manter os animais.




Para mim, o filme fala da solidão. E todos os acontecimentos - como a mudanças das estações, o vento, o sol, tudo - é motivo para reflexões da mulher. Filosofa sobre cada aspectos, por muitos podem ser banais, mas compunham a rotina dela: o tempo, a morte, as escolhas. Fala de como o tempo passa rápido e como se sente mover-se num tempo imóvel; como detesta matar animais; como estar fadada a fazer escolhas é algo pesado. E o quanto essas reflexões beiram a poesia em muitos momentos.

A mulher conta os dias e os meses, numa tentativa de se situar no tempo e espaço, mas talvez para tentar controlar o incontrolável, o imprevisível; também possa ser uma tentativa de afirmar que ela existe num tempo e num espaço, já que todos se esqueceram dela.


Esperei que o filme fosse ter um final dramático - já que as coisas se encaminhavam para um ápice comovente -, mas, como a protagonista anunciava ao longo do filme, nada de dramalhão ou insanidade, a mulher simplesmente aceitou o destino calada e passiva.

No cartaz em inglês, tem a seguinte frase (traduzida no Google Tradutor): "Dentro de cada um encontra-se uma verdade onde só o deserto pode revelar". Talvez a redoma invisível seja aquele espaço mais íntimo em cada um de nós que, isolado do mundo externo, podemos refletir sobre o mundo e sobre nós.

Nota: 8.