segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Ninfomaníaca, vol. I (Nymphomaniac: volume I)


Não considero que Ninfomaníaca seja um filme classificado como "erótico", o sexo que aparece no filme é a demonstração da mais profunda tristeza e vazio, porque na tentativa de sentir alguma coisa, a protagonista busca incessantemente o prazer (no caso, o sexual), para no final sentir nada, só mais vazio. Nesse sentido, Ninfomaníaca lembra outro filme que aborda a compulsão sexual, Shame.

A protagonista, Joe, é encontrada desmaiada no chão da rua e Seligman, o senhor que a acude, a leva para a sua casa e ouve suas desventuras sexuais ao longo de sua juventude. Essa é a sinopse do volume I, apenas.

Joe adulta e Seligman - ela contando sua história para ele

Lars von Trier tem uma narrativa excêntrica - há humor, inclusive em cenas pesadas e humilhantes (como a cena com a Uma Thurman por exemplo), onde não teria absolutamente nada de engraçado, ele faz parecer enfadonho e patético; há comparações inusitadas entre a compulsão de Joe e, pasmem, a pescaria, Bach e a sequência de Fibonacci. É muito interessante. De um lado, Seligman, um senhor, fala da pescaria, enquanto Joe narra como ela fazia para escolher os parceiros sexuais no trem, e Seligman "amarrava" uma coisa na outra. Não sei vocês, mas me pareceu que o tempo todo, Seligman tentava dizer que aquela vida de Joe não tinha nada demais. Parecia haver uma mistura de erudito com o mundano, do culto com vulgaridade.

Uma das comparações. Aqui há a comparação entre uma obra de Bach e três amantes de Joe

Uma coisa que me chamou atenção no filme foi o lema "Esqueça o amor". Era como se Joe e suas amigas, ao transarem enlouquecidamente com qualquer um, fizessem uma resistência ao amor. Àquele amor romântico sem graça, onde as pessoas sofrem em busca do amor étereo, onde existem ciúmes, enfim, à tudo isso elas fazem frente. O interessante é que a melhor amiga de Joe (a mais louca entre elas) se apaixona...

a amiga e Joe no trem



Joe tinha uma relação muito próxima com o seu pai (para alguns, uma relação edípica! rs) e distante com a sua mãe. O pai tinha uma lado poético (a história das árvores e as folhas), os passeios pelo parque com a menina, a atenção prestada. Quando o pai dela adoece, Joe acompanha o pai no hospital até à sua morte. Quando ela o vê morto no leito, se excita. E transa com alguém no hospital. Parece que Joe, ao lidar com o sofrimento e com a dor, vê como único escape, o sexo. Ou melhor, a maneira que Joe descobriu em lidar com o sofrimento é pelo sexo deliberado e frenético. Os instantes de gozo que sente, aliviariam sua dor, seu vazio.
Queria entender melhor essa infância da Joe. Teria havido alguma coisa que a fizesse compulsiva por sexo? Queria entender melhor o destino da relação dela com a mãe.

o pai de Joe no leito 

Durante a sua juventude, Joe transava com muitos homens e não media as consequências; lidava com os homens friamente (quer dizer, ela simulava ser uma pessoa doce, mas na verdade não sentia nada afetivamente pelas pessoas com quem se relacionava), elaborava várias estratégias na conquista, caçava com impetuosidade, se entregava ao sexo, mas permanecia insatisfeita. Assim como se relacionava facilmente, se distanciava com a mesma facilidade. Elaborava desculpas para abandonar seus parceiros, jogava dados para decidir quem deveria dispensar, tudo sem medir esforços. Eu esperava ver muitas consequências trágicas, a mais forte foi a cena com a Uma Thurman, que é humilhante e cômica ao mesmo tempo. 



Joe conhece Jerôme na adolescência e o reencontra em outras ocasiões da sua vida, e, sem dúvida, a relação dela com ele é diferente... Estaria sentindo o famigerado "amor"? Cria-se uma grande expectativa no reencontro dos dois e, depois de um longo intervalo (é o que me pareceu), a conclusão a que se chega é que nem o "amor" é o suficiente... (se é que podemos chamar o sentimento de Joe por Jerôme de "amor", vamos aguardar o volume II para afirmar ou não isso). E saber disso é doloroso demais. É trágico.
Seria o "amor" a grande solução para o sofrimento de Joe? O que ela estaria buscando incessantemente e não encontra?
O que aconteceu ao longo de sua vida para que ela se sentisse um "ser humano mal" e sentindo-se culpada? O que ela foi capaz de fazer para (tentar) suprir  esse "não sentir nada"? 
De fato, a atriz que interpreta Joe na juventude consegue passar essa sensação de vazio: o olhar é vago, a frieza diante de situações intensas, o sexo é obsessivo, é indiferente diante do sofrimento alheio, joga com o sentimento das pessoas... é isso, nada

Jerôme
No volume I eu esperava mais sofrimento, mais loucura e mais tragédia (credo!), mas o filme se passa quando Joe ainda é jovem, ou seja, não deu tempo de acontecer as tragédias e de experimentar outras coisas que potencializassem a sensação de prazer... 
E sim, tem cenas de sexo explícito mesmo (e no Brasil, ainda foram cortadas algumas cenas!), então, se você não gostar desse tipo de coisa, não assista.


Estaria o filme propondo um novo conceito de "amor" ou a dissolução completa desse ideal? 

Acredito que o Volume II seja mais pesado e mais sofrido, Joe já estará na fase adulta e, imagino, com a vida em frangalhos. Muita expectativa!

É o filme que fecha a "Trilogia da Depressão", então, sugiro que assista os anteriores: Anticristo e Melancolia. Aviso aos desavisados, são filmes muito pesados emocionalmente!

Nota: 8,5. 

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